11 novembro 2010

Clássico (XLVII): pronto, vamos todos dizer em uníssono "não há campeões à 10ª jornada"!

Não só todos temos achado muita piada aos resignados que entregam o título ao FC Porto à 10ª jornada, sem esconderem o seu desalento e frustração tanto como a incomodidade de o reconhecerem e a secreta esperança de tal se virar como um feitiço contra o feiticeiro, mas já vimos que o líder André Villas-Boas continua a dar-lhes o troco e promete, antes dessas visões do futuro e palpites antes do jogo, manter o nível de alerta para que a equipa dos dragões não se entusiasme e afrouxe a sua dinâmica de vitória.
Podemos todos admitir que, nesta senda, com este ritmo, perante tanta categoria, com todos os jogadores em pleno - o que não é fácil e até raramente acontece a qualquer equipa de futebol de topo -, nesta altura, neste preciso momento, também é "vaticinável" prever o FC Porto campeão.
Nem é tanto pela diferença pontual, mas mais pela forma esmagadora com que o FC Porto arrumou, até moral e psicologicamente, o seu mais directo opositor. Implacável realidade.
Mas AVB já alertou que "não é assim", nós sabemos que não é assim.
Como sabemos que, em Guimarães, com festival de bola e golos perdidos, passámos de um jogo dominado a um empate que custou a engolir e os cábulas da TVI passaram dessa resignação prostrada para a euforia incontida. Algo, aliás, que o balde mar e o manhoso do costume quase repisaram em Coimbra, com aquela bola no poste e a recarga sobre a barra nos instantes finais, depois de anunciarem a vitória como garantida e que com 1-0 nunca estará em jogo algum.
Devemos cantar em uníssono "não há campeões à 10ª jornada". Secundando o técnico que aposta, ao invés, em manter os níveis de confiança, sim, mas em alerta permanente.
Melhor: AVB sentenciou que "só quem não conhece a história do futebol pode achar isso", que nenhuma situação não pode ser invertida.
E, ridículo, depois de andarem a questionar José Mourinho, até com a ideia de contrapor a sua visão à do antigo discípulo mas não clone, antes do clássico, sobre se os 10 pontos em caso de vitória portista sentenciariam o campeonato, agora não foram perguntar se os 5-0, esse estrondoso e enfático resultado ante o rival mais directo que significou a sua maior humilhação ante o FC Porto, não agravariam esse caso.
Os pés-de-microfone que acorreram a Madrid para um derby como se fosse o epígono do confronto regional entre o recreativo e o desportivo de Lisboa, podiam ter perguntado isso a Mourinho após o Real-Atlético, sabendo a tempo do 5-0 do Dragão.
Voltando a Villas-Boas, a história do futebol tem-nos dado conta de muitas recuperações históricas.
Aliás, os benfiquistas lembram ainda como levaram 7-1 em Alvalade em Dezembro de 1986, viraram a 1ª volta com 4 ou 5 pontos de atraso (valia a vitória dois pontos apenas) e acabaram campeões, ganhando ainda a Taça de Portugal.
E eu, pessoalmente, lembro-me de um 5-0 do Benfica ao Sporting na Taça de Portugal, na Primavera de 1986, mas que levou o Sporting a ganhar, depois, na Luz, por 2-1, o que conjugado com a vitória portista em Setúbal com um golo em slalom de Futre, permitiu ao FC Porto saltar para o comando a duas jornadas do fim e garantindo o título no fecho com o Covilhã (4-2), enquanto o Benfica ainda veio perder ao Bessa e acabou, inesperadamente, a dois pontos do improvável campeão.
Podemos, de resto, encontrar inúmeros casos de recuperações em campeonatos estrangeiros.
Ainda na época passada, por exemplo, o Young Boys teve 16 pontos de avanço ao cabo de 8 jornadas até final de Agosto (na Suíça o campeonato começa em Julho) sobre o Basileia. Pois o Basileia acabou o campeonato a ganhar em Berna ao rival por 3-0, na última ronda, quando o empate ainda favorecia os visitados em igualdade pontual até à derradeira jornada.
Tivemos, na última época de Mancini no Inter, uma vantagem de quase 20 pontos sobre a Roma e em risco de esvair-se na última jornada, segurando o scudetto por um ponto e graças a vitória fora com bis de Ibrahimovic nos 20 minutos finais quando o campeonato, naquela altura, estava nas garras da loba romana.
O próprio Mourinho, aliás, na época passada teve 11 pontos de avanço sobre a Roma à entrada da Primavera, passou cinco jornadas a ganhar só uma vez, perdeu em Roma, empatou em casa e foi suplantado pela equipa de Ranieri a 5 jornadas do fim, para os romanos cederem, inesperadamente, em casa com a Sampdória (de 1-0 para 1-2), de forma que o Inter voltou ao comando mas só um golo de Milito a meia hora do fim em Siena valeu o título que a Roma se preparava para resgatar das mãos do Inter.
Mourinho, em Portugal pelo FC Porto, chegou em Março de 2003 à Luz com 10 pontos de avanço. Faltavam umas 11 jornadas (das 34 no total) para o final. Deco marcou, o Porto ganhou, Mourinho deu-se ao luxo de acabar o jogo com Marco Ferreira e Tiago (ex-Leiria e depois Boavista) em campo, aumentou a contagem para 13 pontos e não cantou vitória no campeonato que ganharia com 11 pontos de avanço na época da tripla histórica com Taça UEFA e Taça de Portugal que "fizeram" perder alguns pontos (derrota em P. Ferreira).
Mourinho não aceitou que o campeonato estivesse resolvido, com 13 pontos a 11 jornadas do fim, mas gozou com os pasquins lisbonenses, se se lembram:
"Vocês são fantásticos, chegaram a fazer acreditar que se o Benfica ganhasse e reduzisse a desvantagem para 7 pontos o título estava relançado. Parabéns, porque fizeram por tudo para que acontecesse".
Já há quase 3 anos, a 1 de Dezembro de 2007, também Jesualdo Ferreira negou que o campeonato tivesse sido resolvido à 13ª jornada, após a vitória na Luz com a trivela de Quaresma entortando os quadris a David Luiz pelo caminho. O FC Porto entrou na Luz com 4 pontos de avanço, poderia ficar apenas com 1, saiu de lá com 7, acabou a 27 pontos do Benfica que quis fazer as coisas por outro lado para ir à Champions em 2008. Mas Jesualdo não sentenciou a questão do título. Lá. Na Luz. Porque no fim da época, em entrevista, confessou que a chave para o título foi precisamente ter ganho na Luz. Só que, obviamente, pela época fora há outras competições, desgaste, castigos, lesões, a Imprensa normalmente contra, à espera de deslizes para que os grémios lisbonenses se incentivem, se motivem, pressionem, ou se a coisa der para o torto, a distância alargar a diferenças pornográficas, desvalorizarem, diminuírem, deslustrarem a carreira do FC Porto.
Isto é assim e o FC Porto, como sabemos, só pode contar consigo próprio. Tal como em 2008 salientei, o desafio é superar-se a si mesmo, alcançar mais vitórias, conquistar mais troféus, ganhar sempre e nunca afrouxar que esta gente à volta não é de confiança.
No íntimo sabemos que está ganho, pode ser, mas na prática a coisa pode apertar e ninguém gosta de se ver em apertos.
Em 1999, pela 7ª jornada, depois de 3-0 ao Sporting com dois ou três de Jardel, com muitos pontos de avanço que eram 7 ou 9 ao final da 1ª volta, Roquette afirmou que "a melhor equipa não ganhará o campeonato". E não ganhou, em 2000 veio o roubo de Campo Maior, depois em Abril a derrota na Luz com um golo de sorte e outro negado a Clayton de canto directo, o desgaste europeu contra um Sporting que foi eliminado na 1ª ronda e no total da época disputou menos 13 jogos oficiais do que o FC Porto de Fernando Santos que era Pentacampeão, tudo se precipitou pelo lado negativo e a melhor equipa, de facto, não foi campeã.
Como diz o outro, o futebol é isto. Convém não esquecer. Os axiomáticos das opiniões, que as debitam como quem come tremoços e não são responsabilizados nem por elas quanto menos por jogos não ganhos ou opções tácticas que não são deles, nunca pagarão pelos seus vaticínios e estarão aí a gozar se tudo correr contra o que previram. Pois é, prognósticos só no fim.

5 comentários:

  1. excelente texto... mas que grande memória tens, porra!

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  2. Excelente apontamento, como sempre Zé Luis.

    Todos sabemos que a lógica no futebol rege-se por muitos factores externos (lesões, suspensões, desmotivação...) que faz do previsivel o surpreendente. Lembro-me de que o ano da queda em desgraça de Rijkaard resultou após a debacle do Barça no Mundial de Clubes. A partir daí, em Janeiro, foi sempre a descer e o Madrid, com um brutal atraso pontual, acabou campeão no ultimo jogo.

    No entanto se os niveis de motivaçao estiverem em alta acredito que nada poderá perturbar a corrida ao titulo porque o plantel é largo e bem apetrechado. Vejo mais problemática a questao europeia porque temos legitimas ambiçoes na LE e como bem disse Mourinho em 2004, antes de Gelsenkirchen, para ganhar uma prova destas convém ter um bom colchao de pontos que garantam deslizes inevitaveis. É isso que devemos procurar ter até Fevereiro.

    um abraço

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  3. Luís, é mesmo de memória e um ou outro recurso a arquivo. Se fosse a vasculhar a papelada toda dava um livro.

    Amiúde essa memória também me atraiçoa, falho por isto ou por aquilo mas recuso ir pela via da leviandade, do facilitismo, dos que acham que está tudo feito.

    Eu sigo o futebol com atenção há muitos anos, o que vejo em directo normalmente fica-me na memória, o que não vejo em diferido já não fica tão bem registado porque vibro com as coisas na hora e guardo essas emoções comigo.

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  4. Miguel,

    o AVB viveu essas épocas gloriosas de 2003 e 2004 por dentro, como viveu as que ele passou no Chelsea e sabe que houve hora de aperto.

    Em 2003 e 2004 o FC Porto fez o recorde nacional de 55 e 56 jogos oficiais e no plano interno há que cavar diferença pontual, amealhar no Outono para passar o Inverno e estar confortável na Primavera.

    Essa almofada de segurança é o que AVB quer de novo, para atacar as finais das provas, sendo que aquelas com eliminatórias são penosas, apanham-se os grandes candidatos também e algum desaire mais pesado pode comprometer o percurso regular do campeonato.

    Isto só tem algo de novo para os parvos que fazem de conta que nunca viram ou quem não sabe mesmo e é néscio por natureza.

    Muitos dos observadores incluem-se no primeiro grupo, sendo a maioria de Lisboa é raro passarem por momentos destes, de longa duração e de repetidas épocas nestas andanças. São os calhaus com dois olhos. OLhas para as tv's e vê-los a todos.

    Os néscios, os que olham para isto de vez em quando, como a maioria dos adeptos, julga o momento em Março ou Abril pelo que sucede agora, daí a certeza de o momento actual ser projectado, como por magia ou incontornável determinismo, para o fecho das temporadas.

    Quem não sabe é como quem não vê.

    Abraço

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  5. eu, nascido em 1981, tenho como mais antiga memória futebolística a final de 1987 em Viena... não sabia muito bem o que estava em causa ali naquele jogo, mas lembro-me que pela primeira vez os meus pais me deixaram jantar sentado no sofá da sala a ver televisão ;)

    das outras finais não me lembro dos jogos da supertaça europeia, mas lembro-me bem do "jogo da neve" :) que acho que ainda era de madrugada/noite escura, se a minha memória não me atraiçoa... lembro-me de estar na casa dos meus avós (provavelmente seria um fim-de-semana), com tios e primos a sofrer com o sono, frio e com o jogo

    de memória mesmo só a partir do treinador Carlos Alberto Silva... aí passei a acompanhar os jogos na televisão e nos jornais

    em relação a ligas de outros países eu não sigo, nem nunca segui, a não ser aquilo que passa nos noticiários dos diversos canais

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